|Educação Especial e Inclusiva Brasileira| #2 – A sala de aula inclusiva (V.3, N.9, P.18, 2020)

Tempo estimado de leitura: 8 minute(s)

Divulgadoras da Ciência:

Priscila Benitez – Grupo de Pesquisa em Educação Especial e Inclusiva [Lattes]

Claudia Regina Vieira – Grupo de Pesquisa Surdos e Libras – SueLi [Lattes]

 

Os professores de educação especial, com atuação colaborativa em sala de aula comum, mapeados no estudo de Benitez et al. (2017), em geral, são aqueles contratados para atenderem as demandas dos profissionais de apoio. Nas escolas estaduais de São Paulo, assim como em algumas escolas municipais do interior e da região metropolitana de São Paulo, os profissionais de apoio são agentes educacionais, sem qualquer formação inicial em educação especial, que atuam apenas aos cuidados de higiene e saúde do estudante, apesar de terem que cumprir todas as atribuições descritas na Nota Técnica de 2010 (apud Benitez et al., 2017). Além disso, os profissionais intitulados como “cuidadores” nas escolas estaduais de São Paulo não estão autorizados a desenvolver um trabalho no contexto de sala de aula e permanecem, muitas vezes, nos corredores escolares, enquanto os alunos estão sem nenhum suporte na sala de aula. A contratação de tais profissionais, em geral, ocorre por meio de empresas terceirizadas, sem qualquer formação profissional inicial em práticas inclusivas, que visam a autonomia e independência do público-alvo da educação especial.

 

Isso significa que tais estudantes, na maioria das vezes, não têm acesso aos serviços educacionais especializados na sala de aula comum e, muitos deles permanecem analfabetos, de acordo com os dados do Censo de 2010 (principalmente, com deficiência intelectual e ausência de dados sobre o desempenho pedagógico dos estudantes com autismo, por não terem sido mapeados em tal Censo). Esse cenário ressalta que o profissional de apoio ao ser considerado como aquele que não carece de formação inicial específica em educação especial dificulta o processo inclusivo, ao invés de propor os sistemas de apoio que os estudantes necessitam para desenvolver as respectivas aprendizagens.

 

Em casos pontuais, é possível identificar o serviço do coensino em políticas municipais de educação, algumas delas asseguradas via Conselho Municipal de Educação. Outra forma de viabilizar tal serviço, tem sido por medida judicial, junto ao Ministério Público. A partir da divulgação das normativas, via projetos de extensão e de pesquisa, na parceria entre escola e universidade, é possível garantir o direito educacional dos estudantes com deficiência e transtorno, a partir da judicialização. As ações solicitadas, em geral, são atendidas, tanto para as escolas públicas, como privadas, o que significa que os estudantes, cujos pais abriram processos na Defensoria Pública tiveram o direito do seu filho garantido, por meio de um professor com atuação colaborativa em sala de aula comum, junto ao professor de sala.

 

Já em relação aos estudantes surdos, de acordo com Vieira (2011), embora as políticas educacionais estejam propondo mudanças desejáveis e as filosofias educacionais tradicionais oralistas, hoje vistas como prejudiciais ao ensino de pessoas surdas, tenham sido teoricamente abolidas do espaço escolar, nas escolas inclusivas ocorre um grande equívoco quanto ao que se oferece como educação bilíngue para o aluno surdo. As ações relativas à Língua de Sinais são, na melhor das hipóteses, incipientes e tímidas.

 

No contexto universitário, a situação não é diferente, em situações pontuais, algumas universidades organizam o trabalho na sala de aula inclusiva, por meio de serviços prestados por estudantes de graduação bolsistas, sem qualquer formação inicial em educação especial e inclusiva. Uma notícia promissora tem sido recorrentemente relatada e documentada em processos seletivos para contratação de profissionais no âmbito dos Institutos Federais, que contam em seu corpo docente com profissionais doutores especializados para oferta do AEE, realização do PEI, acompanhamentos no contexto da sala de aula e formação contínua de docentes, atuando conforme previsto no Documento Orientador do Programa Incluir (2013), com ações em infraestrutura, currículo, comunicação e informação, programas de extensão e de pesquisa.

 

Pensar em inclusão significa garantir uma educação para todos. E, nesse contexto, o direito à educação para todos os brasileiros requer mais trabalho e sobretudo, ações concretas que alavanquem a escola pública e a universidade para todos. Inclusão implica na reorganização escolar para atender as demandas de todos os seus estudantes, de acordo com suas especificidades e, também requer que as escolas e universidades sejam capazes de empreender respostas personalizadas que ensinem todos os estudantes presentes no cenário educacional. Garantir a educação para todos, de acordo com os pressupostos descritos na Declaração Mundial de Educação para Todos (1990) e Declaração de Salamanca (1994) significa garantir a equidade, por meio de serviços que sejam implementados por profissionais qualificados na área da educação especial inclusiva, a despeito das práticas colonizadoras, assistencialistas e segregadoras que tradicionalmente marcaram a história da educação especial brasileira.

 

 

Referências

 

Benitez, P., Gomes, M., Bondioli, R., & Domeniconi, C. (2017). Mapeamento das estratégias inclusivas para estudantes com deficiência intelectual e autismo. Psicologia em Estudo (Maringá), 1(22), 81-93.

Benitez, P., & Domeniconi, C. (2018). Atuação do psicólogo na inclusão escolar de estudantes com autismo e deficiência intelectual. Psicologia Escolar e Educacional, 22(1), 163-172.

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Vieira, C.R. (2017). Educação bilíngue para surdos: reflexões a partir de uma experiência pedagógica / Claudia Regina Vieira; orientação Karina Soledad Maldonado Molina Pagnez. São Paulo.

Vilaronga, C. A. R., & Mendes, E. G. (2014). Ensino colaborativo para o apoio à inclusão escolar: práticas colaborativas entre os professores. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 95(239), 139-151.

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