Uma nova lei pode aumentar a competitividade do transporte por cabotagem no Brasil? (V.6. N.3. P.5, 2023)

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Prof. Dr. Delmo Alves de Moura (delmo.moura@ufabc.edu.br)
Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção – PGEPR (CECS)

A Lei nº 14.301 de 07/01/2022 institui o Programa de Estímulo ao Transporte por Cabotagem (BR do Mar). O cerne desta nova lei é aumentar o transporte por cabotagem no Brasil, balanceando a matriz de transporte nacional, que hoje é predominantemente rodoviária, mais de 62% de tudo que é transportado no país é realizado pelas rodovias, que na sua maioria, possui condição muito precária, aumentando drasticamente os custos de transporte.

O Brasil possui uma extensão territorial de um continente. Com isto, é essencial explorar o potencial de cada um dos modais de transportes, de forma a otimização a operação e reduzir os custos operacionais do fluxo de transporte. Para isto, a integração entre os modais é primordial para o sucesso de um sistema logístico.

A BR do mar, o transporte por cabotagem, visa ser o grande elo no gerenciamento da cadeia de suprimentos (transportes) de um sistema integrado. O cerne é utilizar a enorme costa marítima que o Brasil possui e fazer boa parte do transporte, através dos navios. A extensão navegável da costa brasileira é de aproximadamente 7.400 km. A cabotagem é o transporte marítimo realizado na costa de um país.

Com o uso da cabotagem, o Brasil pode aumentar o transporte no modal aquaviário e com isto reduzir a matriz de transporte rodoviário otimizando as operações logísticas. O Brasil possui 37 portos em toda a sua costa e mais de 147 Terminais de Uso Privado (TUPs), também ao longo de sua costa marítima. Com isto, há como atender toda a região do país, visto que a maioria da população, cerca de 80%, moram numa faixa de distância, de aproximadamente, 200 km do litoral nacional.

A figura 1 mostra o mapa do Brasil e faz uma analogia com uma rodovia, que seria o transporte marítimo por cabotagem, na costa brasileira. O uso de navios para o transporte de mercadorias, utilizando os portos de forma eficiente e eficaz pode contribuir para uma forte integração entre os modais de transporte.

 

Figura 1: BR do Mar – o Transporte por Cabotagem

 

Portanto, desde o Rio Grande do Sul, até o estado do Amazonas (Manaus), o transporte por cabotagem (marítimo) tem condições de melhorar os aspectos logísticos do Brasil e consequentemente integrar com os demais modais de transporte (rodoviário, hidroviário, ferroviário e dutoviário), visando que cada um possa utilizar seu potencial logístico de forma otimizada.

O transporte marítimo na costa brasileira (cabotagem) não necessita de construção de rodovias, o mar é a rodovia do sistema e já está pronto para o uso. Os portos brasileiros necessitariam de infraestrururas adequadas, para otimizar as operações logísticas deste sistema e a parceria pública privada pode contribuir para alavancar este processo e melhorar as condições logísticas portuárias.

Diversos tipos de cargas podem ser transportadas via cabotagem, entre as regiões do Brasil, de norte a sul. Ter terminais portuários dedicados aos navios de cabotagem, pode ser também um ponto relevante para melhorar a integração com os demais modais de transportes no país.

Utilizar as tecnologias da Indústria 4.0 (Internet das Coisas – IoT, Segurança Cibernética, Realidade Aumentada, Big Data, Automação Robótica, Manufatura Aditiva, Simulação, Integração de Sistemas e The Cloud – Gerenciar os Sistemas nas Nuvens – Blockchain) podem contribuir bastante para o gerenciamento da cadeia de suprimentos deste sistema logístico (MOURA, 2020a).

Além do foco logístico, o uso de navios para o transporte, pode contribuir para um tópico de extrema importância atualmente, o uso de sistema sustentável que contribua para reduzir a emissão de poluentes na atmosfera. O uso da cabotagem, se bem aplicado, pode alavancar um projeto logístico sustentável, com baixo emissão de gases poluentes. Pode contribuir para reduzir com o congestionamento nas rodovias nacionais, aumentar a segurança no transporte e acima de tudo ser sustentável, quando o foco está em grandes distâncias percorridas, como é o caso da extensão territorial do Brasil (MOURA, BOTTER, 2019, MOURA, 2020b).

Atrair grandes empresas para participar deste sistema logístico é fundamental para o sucesso da operação, definir boas práticas de operações logísticas, ofertar um serviço com alta grau de confiabilidade e frequência, são elementos primordiais nesta operação. Além disto, desburocratizar o sistema e torná-lo bem coeso, de fácil acesso eletronicamente e integrado com os demais modais, é a chave de sucesso deste sistema de transporte.

A União Europeia, cada vez mais, está investindo neste sistema de transporte em sua região, o chamado Short Sea Shipping – SSS (cabotagem) e isto está melhorando o fluxo de transporte entre os países participantes e consequentemente reduzindo os custos operacionais da região. Os Corredores Verdes europeus (Green Corridors) possuem como foco, a integração entre os modais de transporte, com especial atenção no uso da cabotagem (SSS).

Portanto, a União Europeia nos ensinou que é possível investir neste tipo de transporte por cabotagem e obter vantagens competitiva no gerenciamento da cadeia de suprimentos, além de contribuir bastante com os aspectos sustentáveis de operações logísticas (MOURA, 2020c; KONTOVAS, 2014).

O uso de contêineres nas operações de transportes está crescendo mundialmente, e no Brasil, no transporte interno, este fator também é uma realidade. Portanto, um navio de contêiner possui uma capacidade enorme de movimentação de transporte de produtos/mercadorias que podem reduzir o uso de milhares de caminhões nas rodovias nacionais, entre as regiões norte e sul do país. A figura 2 apresenta um navio de transporte de contêineres, que pode contribuir para retirar diversos caminhões da estrada, para longas distâncias, corroborando para questão de sustentabilidade, pela menor emissão de gás carbônico, quando comparado ao transporte rodoviário (MOURA, BOTTER, 2017; YANG et al., 2020; SISLIAN, JAEGLER, CARIOU, 2016).

 

Figura 2: Transporte marítimo de contêineres

 

O Brasil precisa dar atenção especial a Lei nº 14.301 de 07/01/2022 que institui o Programa de Estímulo ao Transporte por Cabotagem (BR do Mar) e não perder a oportunidade de tentar reunir os principais atores/players (empresas, governos Federal, Estadual e Municipal, universidades, centros de pesquisa etc.) e implantar um sistema viável logisticamente, visando integrar todos os modais de transporte, com intuito de reduzir os custos operacionais e contribuir com a sustentabilidade nas operações logísticas, na armazenagem e movimentação de mercadorias/produtos em todo o país.

 

Referência Bibliográfica

KONTOVAS, C. A. The Green Ship Routing and Scheduling Problem (GSRSP): A conceptual approach. Transportation Research Part D, Vol. 31, 61-69, 2014.

MOURA, D. A.; BOTTER, R. C. Essential factors for the implementation of sustainable port logistics operations. Pan American Congress of Naval Engineering, Maritime Transport and Port Engineering. COPINAVAL, Cartagena, Colômbia, 2019.

MOURA, D. A. Indústria 4.0 – análise de operações portuárias em terminais de contêineres. XXVII Simpósio de Engenharia de Produção, SIMPEP, Bauru, São Paulo, 2020a.

MOURA, D. A. Operações portuárias sustentáveis (green) – um estudo do porto de Santos. XXVII Simpósio de Engenharia de Produção, SIMPEP, Bauru, São Paulo, 2020b.

MOURA, D. A. Transporte logístico sustentável –modelo de corredor verde para o Brasil. XXVII Simpósio de Engenharia de Produção, SIMPEP, Bauru, São Paulo, 2020c.

MOURA, D. A.; BOTTER, R. C. Challenges for implementation of the green corridor in Brazil. International Maritime Association of the Mediterranean – Maritime Transportation and Harvesting of Sea Resources, IMAM, Lisbon, 2017.

SISLIAN, L., JAEGLER, A., CARIOU, P. A literature review on port sustainability and ocean’s carrier network problem. Research in Transportation Business & Management, No. 19, pp. 19-26. http://dx.doi.org/10.1016/j.rtbm.2016.03.005, 2016.

YANG, Z., SUN, J., ZHANG, Y., WANG, Y. Synergy between green supply chain management and green information systems on corporate sustainability: an informal alignment perspective. Environment, Development and Sustainability, No. 22, pp. 1165-1186. https://doi.org/10.1007/s10668-018-0241-9, 2020.

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