Infância em Tempos de Covid-19: impressões de professores que realizaram curso online do Unicef (V.3, N.10, P.17, 2020)
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Como pudemos acompanhar através dos mais diversos meios de comunicação, a partir do final de 2019, houve diversos casos fatais de pneumonia, desencadeados por um novo tipo de Coronavírus sensível aos seres humanos, na cidade Chinesa Wuhan. No início de 2020, o vírus se espalhou por outros países do mundo e em março do mesmo ano chegou ao Brasil. O Senado Federal Brasileiro, no dia 20 de março de 2020, por meio do Decreto Legislativo nº6 de 2020, “reconhece […] a ocorrência do estado de calamidade pública, nos termos da solicitação do Presidente da República encaminhada por meio da Mensagem nº 93, de 18 de março de 2020” (BRASIL, 2020).
Diante deste cenário, iniciou-se um longo período de quarentena onde serviços não essenciais e aulas foram suspensos, dando origem a um “novo modo de viver”. Pessoas de todo o mundo tiveram que se readaptar para desenvolver ações básicas do cotidiano como ir ao trabalho, mercado, consultas de rotina, entre outros. Além disso, profissionais das mais diversas áreas tiveram que inovar na estruturação de trabalho, uma vez que restaurantes (considerados serviços essenciais) não poderiam mais permitir o consumo no local, por exemplo. Essa condição impulsionou a educação, saúde, comércio e demais serviços iminentes a adotarem o atendimento remoto, criando estratégias e reformulando estratégias de atendimento a fim de garantir a prestação do serviço e suprimir as demandas e necessidades das pessoas.
Como consequência, no meio educativo, houve a ascensão do trabalho pedagógico e formação (inicial, básica, continuada etc.) de modo remoto, estreitando o convívio familiar e ascendendo outras questões complexas, de caráter humano, sem antecedentes para esta geração. Embora o período tenha se tornado desafiador em todos os sentidos, a educação, em especial, passa por um momento de preocupação mundial. Gestores, professores, alunos e famílias de todo o mundo tiveram que se adequar a fim de assegurar processos pedagógicos de aprendizagem em tempos de pandemia sem que os discentes fossem lesados em seu desenvolvimento integral: educacional, de saúde, psicológico, emocional.
Tendo como foco de preocupação a infância e suas implicações com tantas mudanças, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) elaborou (a partir de sites oficiais e literatura científica) e disponibilizou em suas plataformas online o curso “Infância em Tempos de COVID-19”, que busca trazer orientações e ampliar os conhecimentos do cursista em relação à temática. Como apontado na seguinte chamada do curso: “Ao final do curso você será capaz de compreender como a COVID-19 impacta a vida das mulheres, cuidadoras e crianças, e como você poderá atuar para amenizar os efeitos danosos da pandemia nas diferentes infâncias de sua realidade local.” (Unicef, 2020).
Para tanto, o curso é gratuito, possui carga horária de 4 horas e está dividido em oito unidades, sendo estas: (1) Conceitos básicos; (2) Prevenção e tratamento; (3) Pré-Natal, parto e puerpério no âmbito da Covid-19; (4) Aleitamento no contexto da Covid-19; (5) Imunização no cenário da Covid-19; (6) Alimentação saudável e complementar na situação da Covid-19; (7) Saúde mental das crianças e seus cuidadores em tempos de Covid-19; e (8) Verdade x Fake News (notícias falsas). Cada unidade é acompanhada de uma ficha técnica (com os nomes dos produtores de conteúdo e instituições que colaboraram com a produção do mesmo), textos informativos e vídeos. Ao final das oito unidades o cursista deve responder uma pesquisa de satisfação e realizar um teste contendo quinze questões de múltipla escolha, devendo acertar 70% das questões para a emissão de um certificado online. Desse modo, os idealizadores do curso dizem esperar uma abordagem de “diferentes questões relativas à prevenção, identificação precoce de casos na comunidade e encaminhamento para o tratamento da COVID-19” (Unicef, 2020), e ainda apontar a “importância da manutenção dos serviços essenciais de saúde e dos direitos das crianças” (Unicef, 2020).
António Guterres, secretário geral da ONU, disse em pronunciamento em abril deste ano que o atual momento pode ser considerado “uma pandemia sem precedentes” e arriscamos a afirmar que a busca pela vacina do covid-19 é a corrida científica mais importante que desta geração já presenciou e que talvez, irá presenciar. Além disso, como apontado pelos idealizadores do curso:
Nesta situação de rápidas mudanças pela epidemia, as crianças são expostas a grandes quantidades de informações e altos níveis de estresse e percebem a ansiedade nos adultos ao seu redor. Ao mesmo tempo, as crianças estão passando por mudanças em sua rotina diária. Diante de tais eventos desafiadores, essas mudanças podem provocar alterações futuras de comportamento. Mas, se a criança se sentir acolhida e amada, isso pode ajudá-la a desenvolver um comportamento resiliente, ou seja, a capacidade de transformar experiências negativas em aprendizado e de se adaptar durante e após momentos de adversidades. (Unicef, 2020).
Deste modo, a preocupação de famílias, professores e gestores é despertada e é iniciada a busca por fontes de informações seguras, cursos de formação e meios de efetivamente acolher e minimizar os impactos desta realidade a curto e longo prazo na vida das crianças e suas famílias e, por se tratar de uma doença nova e uma situação para a qual não estávamos preparados, existe uma carência e desconfiança do que é oferecido e disponibilizado, principalmente nos ambientes online que estão repletos de Fake News e informações equivocadas. Assim, um curso oferecido por uma instituição respeitável e elaborado a partir de fontes confiáveis, parece uma boa porta de entrada.
O curso “Infância em tempo de Covid-19” foi inicialmente elaborado tendo como foco os agentes comunitários de saúde, lideranças comunitárias e visitadores domiciliares, no entanto, foi constatada a divulgação do curso no portal da educação online de um município do ABC Paulista, incentivando que os professores de sua rede, especialmente aquele atuantes na creche e na pré-escola, o realizassem, buscando a aplicabilidade dos conhecimentos adquiridos em suas práticas pedagógicas e como aporte teórico nas orientações, acolhimento e cuidado com as crianças e suas famílias, em especial aquelas mais carentes. Desse modo, buscamos apresentar aqui breves impressões dos professores que realizaram o curso e comprovar se é viável e possível se apropriar e implantar os saberes do curso no cotidiano pedagógico.
Doze professores, que realizaram o curso, responderam um questionário online de modo voluntário para nos auxiliar a entender e elaborar respostas para os questionamentos apontados até agora. Foram identificados os seguintes resultados:
Quando questionados sobre as unidades do curso que mais chamou a atenção e/ou agregou novos conhecimentos, 8,3% assinalaram “Conceitos básicos”, 25% “Prevenção e tratamento”, 0% “Pré-Natal, parto e puerpério no âmbito da Covid-19”, 8,3% “Aleitamento no contexto da Covid-19”, 8,3% “Imunização no cenário da Covid-19”, 8,3% “Alimentação saudável e complementar na situação da Covid-19”, 41,7% “Saúde mental das crianças e seus cuidadores em tempos de Covid-19” e 8,3% “Verdade x Fake News (notícias falsas)”.
58,3% dos educadores que responderam ao questionário alegaram que não realizaram outro curso sobre a temática e que. 91,7% apontaram que o curso, apesar de ser destinado a agentes de saúde, agregou novos conhecimentos que podem ser benéficos a suas práticas pedagógicas e, nesse sentido, 83,3% ainda acreditam que podem realizar um melhor acolhimento, orientação e cuidado com as crianças e suas famílias após a formação ofertada.
Por fim, 91.7% dos educadores afirmaram que indicariam o curso para outros colegas de profissão.
De acordo com os gráficos, podemos concluir que existe a predominância positiva dos educadores em relação ao curso. Embora 58,3% só tenham realizado esse curso oferecido pela Unicef, é nítido pelas outras porcentagens que os conteúdos oferecidos não só agregaram a prática como também ofereceram suporte em relação aos cuidados e acolhimento das crianças e famílias. É possível notar que Saúde mental das crianças e seus cuidadores em tempos de Covid-19 foi a unidade do curso que mais agregou aos conhecimentos dos educadores, o que é oportuno se tratando de educação para a infância.
Além das questões acima citadas, abrimos espaço para que os professores aventassem a necessidade de abordar algum assunto ou informação específica. De acordo com as respostas, pudemos constatar que sentiram falta da abordagem da importância de cuidados com o corpo e a realização de atividades físicas durante este período delicado. Uma vez que a recomendação da OMS é ficar dentro de casa, indicações de possibilidades práticas de atividades físicas que possam ser realizadas em isolamento, além da perspectiva dos benefícios que essas ações podem trazer para a saúde física, emocional e mental para alunos e familiares. Além disso, embora o curso não tenha sido criado diretamente para educadores, outro apontamento foi a ausência de uma plataforma de dúvidas e pesquisa diagnóstica oportunizando o posicionamento de educadores, bem como um curso específico para profissionais dessa área.
Tratando-se de um curso voltado para infância, acreditamos na pertinência dessa colocação: educadores não só podem ser colaboradores na criação de conteúdo, como também podem indicar possibilidades de trabalhos e estratégias de cuidados. Um fórum de discussão nesse sentido seria apropriado, uma vez que a troca de experiências poderia auxiliar para esclarecimento de dúvidas e levantamento de informações a serem utilizadas na própria abordagem com os alunos. Com tudo, concluímos que este curso foi de grande valia para os educadores que o realizaram. É completamente exequível a adaptação de seus conteúdos para a realidade da educação, assim como é possível utilizar dessas informações para acessar as famílias que não possuem acesso, por meio do ambiente escolar.
Além disso, é de suma importância a atualização das informações nessa linha para que se mantenha os cuidados e recomendações indicados pela OMS. Uma vez que em virtude da economia mundial as atividades começaram a ser retomadas em todos os lugares e as vacinas ainda estão em fase de testes, a informação sobre os cuidados e colocá-los em prática por quanto, é o único caminho seguro para superarmos esse período.
Fontes:
BRASIL. Decreto legislativo nº249090982. 2020 Diário Oficial da União. Brasília. DF. Disponível em: https://www.in.gov.br/web/dou/-/decreto-legislativo-249090982. Acesso em: 30/09/2020
UNICEF, Fundo das Nações Unidas para a Infância. Curso: Infância em tempos de COVID. 2020. Curso disponível em:
Todas as praticas compartilhadas foram interessantes. Parabens a todos que compartilharam seus conhecimentos.