Inteligência Artificial: Avanços Permitem Diagnósticos de Glaucoma (V.7, N.8, P.6, 2024)
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Inovações relacionadas à Inteligência Artificial podem auxiliar na detecção de doença oftalmológica, além da utilização em outras áreas da medicina. O uso desta tecnologia, no entanto, apresenta tanto pontos positivos como negativos.
Inteligência Artificial na detecção do glaucoma
Inteligência Artificial (IA) é um dos assuntos que vem gerando interesse em diversas áreas do conhecimento, dada as diversas possibilidades de aplicações. Na medicina, estudos recentes apontam a utilização da inteligência artificial como ferramenta de auxílio na realização de diagnósticos, algo que pode revolucionar a área médica. Destaca-se o uso da IA na detecção do glaucoma, uma doença muitas vezes silenciosa que é a maior causadora de cegueira irreversível no Brasil. Segundo o oftalmologista Roberto Galvão Filho, presidente da Sociedade Brasileira de Glaucoma (SBG), 70% das pessoas que convivem com a doença não sabem que a possui.
O glaucoma é uma doença crônica causada pela alta pressão intraocular, que lesiona e gera mudanças morfológicas no nervo óptico, responsável por transmitir sinais visuais do olho para o cérebro. Isso resulta num dano funcional na visão e, de forma progressiva e irreversível, pode provocar a cegueira. É uma doença que não tem cura e é assintomática em sua fase inicial. Dito isto, um diagnóstico rápido se torna importante para tratar e amenizar a doença. Essa detecção precoce costuma ser feita através da análise de diversos tipos de exames, como tonometria, retinografia, paquimetria, gonioscopia, campimetria computadorizada e tomografia de coerência óptica, que buscam avaliar algumas componentes do olho, tais como disco óptico e da camada de fibras nervosas da retina, e encontrar alterações indicadoras do glaucoma.
A Inteligência Artificial auxilia na análise destes vários dados, encurtando o tempo de resposta, como auxílio à detecção da doença. Utiliza-se o aprendizado de máquina, a aprendizagem profunda e processamento de linguagem natural da IA para processar diversos dados fornecidos e gerar resultados que trazem uma indicação de diagnóstico, seja esta do grau ou da suspeita da doença, para que o profissional oftalmológico possa fazer a análise final.
Entenda mais
Aprendizado de Máquina: treinamento de máquina a partir de um grande volume de dados, sem que estas sejam explicitamente programadas. O aprendizado de máquinas possibilita que as máquinas identifiquem padrões e tentem fazer previsões com base em experiências passadas, auxiliando em tarefas complexas, como classificação e tomada de decisões.
Aprendizagem Profunda: é uma subárea do aprendizado de máquina que se baseia em redes neurais artificiais. Essas redes são inspiradas no funcionamento do cérebro humano e possuem múltiplas camadas de processamento de dados. Com o uso de grandes conjuntos de dados e algoritmos avançados, o aprendizado profundo tem sido amplamente aplicado em tarefas como reconhecimento de imagens, tradução automática e processamento de áudio.
Processamento de Linguagem Natural: se concentra na interação entre seres humanos e computadores, usando a linguagem humana. Essa tecnologia permite que os computadores decodifiquem, interpretem e gerem texto ou fala de maneira mais natural. É comumente usado em chatbots, assistentes virtuais, tradução automática e análise de discursos, facilitando a comunicação e o processamento de diferentes informações.
Aprendizagem Supervisionada: é uma das abordagens no campo do aprendizado de máquina. Nesse tipo de aprendizado, o algoritmo é treinado usando um conjunto de dados que contém exemplos rotulados, ou seja, dados em que as respostas corretas já são conhecidas. O objetivo é fazer com que o algoritmo aprenda a mapear as dados de entrada para as saídas (rótulos ou respostas corretas) correspondentes.
Os resultados dos estudos feitos por Daniel S. W. Ting e Ji-Peng Olivia Li, publicado na revista Progress in Retinal and Eye Research, sobre o uso da IA como auxílio no diagnóstico do glaucoma indicam um aumento na precisão da detecção precoce. O indicador de desempenho dos algoritmos de IA é medido através da área abaixo da curva (AUC) característica de operação do receptor, que considera as variáveis de sensibilidade e especificidade, que podem variar entre 0 e 1. Quanto mais próximo de 1, melhor o desempenho. Sendo assim, os estudos indicaram valores de AUC superiores ou iguais a 0,872, atingindo até o valor de 0,986, indicando alta precisão dos algoritmos e uma contribuição notável da Inteligência Artificial.
No cenário brasileiro, destaca-se que uma ferramenta que usa IA foi desenvolvida pelos professores Edson Satoshi, da Escola Politécnica da USP e Vital Costa, da Unicamp. Ela usa aprendizagem supervisionada para receber diversos dados clínicos e retornar uma confirmação se há suspeita ou não de glaucoma. Segundo os autores, esse sistema desenvolvido tem maior chance de acertar um diagnóstico em comparação ao oftalmologista-geral e a ferramenta acelera a precisão no diagnóstico, além de baratear o processo de tratamento da doença.
Outros usos da IA na medicina
A Inteligência Artificial não substitui os médicos e profissionais da saúde, porém ela pode trazer agilidade na detecção e resolução de problemas de saúde se comparado à avaliação humana. Além disso, um monitoramento constante de dados de pacientes pode ajudar na detecção de doenças assintomáticas nas suas fases iniciais.
Na área de diagnósticos, a coleta, a avaliação, e processamento de grandes quantidades de dados pelos profissionais de saúde são processos muitas vezes difíceis e demorados, ou mesmo inviáveis. Com os avanços da computação na área da Inteligência Artificial e Aprendizado de Máquinas, essas tarefas são executadas de forma mais fácil e se torna possível comparar dados e encontrar padrões relevantes que possam estar relacionados a grupos de pacientes com potencial de apresentarem certa doença. Na prática, estes algoritmos recebem dados que pertencem a certo grupo de pacientes que possuem uma mesma doença em comum e retorna informações em comum destes pacientes, num processo chamado de Aprendizagem Profunda. Uma vez que o algoritmo detectou padrões, ele estará pronto para analisar novos grupos, com a esperança de encontrar quais novos pacientes são suscetíveis à doença que está sendo analisada.
As inteligências artificiais hoje em dia conseguem também fazer uma associação entre sintomas e doenças com o intuito de elevar as chances de fazer diagnósticos cada vez mais precisos. Para isto, grandes bancos de textos, imagens, áudios, e vídeos são os objetos de estudos onde os computadores estabelecem correlações de maneira rápida, descartando o erro humano no tratamento dos dados.
As tarefas de interpretação e reconhecimento de imagens são parte essencial da detecção precoce de doenças, quando aliados ao uso de técnicas de análise de dados e Inteligência Artificial. Um exemplo disto é o projeto iLung, integrado por pesquisadores da PUCRS.
Neste projeto, os pesquisadores conseguem diagnósticos mais precisos, em fases extremamente precoces, de doenças relacionadas ao tabagismo. Isto pode nos ajudar a prevenir prevenir o desenvolvimento de câncer no pulmão, por exemplo.
Referências
ROSA, MARCUS DE. Inteligência Artificial ajuda a detectar doença silenciosa que causa cegueira. Jornal da USP, 3 de Maio de 2019. Disponível em:
https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-da-saude/inteligencia-artificial-ajuda-a-detectar-doenca -silenciosa-que-causa-cegueira/
Acessado em: 17 de Agosto de 2023.
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