Fake News: mais uma forma de desinformar (V.4, N.11, P.4, 2021)

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Divulgadora da ciência:  Mariella Batarra Mian 

Atua como Relações Públicas na Universidade Federal do ABC. Doutoranda em Ciências Humanas e Sociais na UFABC. Mestre em Ciências Humanas e Sociais pela Universidade Federal do ABC – Especialista em Gestão de Marketing. Graduada em comunicação social – habilitação em Relações Públicas -, pela Universidade Estadual Paulista – UNESP.

 Interesse em pesquisas voltadas às áreas de tecnopolítica, neofascismo, memes como gênero midiático, comunicação digital, cibercultura, sociedade do controle, dinâmicas sociais na rede, sociedade da informação e a esfera pública interconectada.

Já faz alguns anos que o termo “Fake News” começou a se popularizar no Brasil e no mundo. A expressão, que em português significa “Notícias Falsas”, passou a ser amplamente utilizada a partir de 2016, quando o magnata conservador e ultradireitista Donald Trump foi eleito presidente dos Estados Unidos com uma dinâmica de campanha inescrupulosa, que marcou um novo modo de operar o cenário político-eleitoral neste século. O modelo inaugurado por Trump tem sido reproduzido por lideranças de extrema-direita de diversos outros países, inclusive pelo atual presidente brasileiro, Jair Bolsonaro.

Contudo, mesmo sendo um termo amplamente utilizado, parece haver uma amplitude de significados sobre o que seriam as denominadas Fake News. Ao mesmo tempo que Trump e seus discípulos ao redor do mundo utilizam o termo para tentar difamar veículos da imprensa tradicional, a expressão também é recorrentemente utilizada para qualificar a enxurrada de conteúdos criados e retroalimentados pelos representantes políticos da extrema-direita. 

Vale ressaltar que, embora haja práticas contestáveis provenientes dos veículos de imprensa tradicional, principalmente dos grandes conglomerados, é preciso combater, veementemente, essas tentativas de deslegitimação do livre exercício jornalístico pois, mesmo que mereça um olhar crítico para suas formas de atuação, a imprensa exerce um papel imprescindível às sociedades democráticas. 

Quando o presidente do Brasil diz em um pronunciamento nacional que a Covid-19 é uma gripezinha ou que o uso de máscaras não é necessário para conter a disseminação da doença, ele não está produzindo uma “Notícia Falsa” ou uma “Fake News”. Não se trata de uma falsidade jornalística. O que ele está fazendo, deliberadamente, é propagar desinformação ao povo.  

Além da disseminação com interlocução direta do próprio líder, como os exemplos citados acima, os grupos políticos de extrema direita também operam na lógica de cooptação das principais redes sociais digitais e da difusão massiva e, ao mesmo tempo, micro segmentada de discursos extremistas, difamatórios, autoritários e pautados, sobretudo, na irracionalidade, em mentiras e na invenção de realidades paralelas, baseadas em narrativas convenientes. Novamente, utilizar o termo “Fake News” não parece ser o mais adequado para qualificar esse modus operandi.

A seguir, alguns exemplos de desinformações espalhadas pelas redes que defendem o uso da Hidroxicloroquina para tratamento da Covid-19 

 

Apesar de muitos desses materiais midiáticos, criados e propagados pela extrema-direita, tentarem simular o formato jornalístico, o teor das mensagens difundidas por estes conteúdos estão longe de se respaldar em quaisquer preceitos éticos que devem direcionar o trabalho dos veículos de imprensa tradicionais.

As desinformações são meticulosamente fabricadas para reforçar discursos radicalizados, criarem narrativas de realidades paralelas, propagarem ideais “lacradores” e discursos de ódio. Elas são difundidas nos mais variados formatos midiáticos (vídeos, imagens, memes, áudios e textos pseudojornalísticos), inundam as redes sociais digitais e circulam ininterruptamente em aplicativos fechados de mensagem instantânea, como o Whatsapp e o Telegram. 

A maioria dos conteúdos é marcada pela estética espetacularizante, com narrativas simplistas e binárias que dialogam com sentimentos e crenças dos cidadãos.  Além disso, e talvez esse seja o elemento mais complexo de ser combatido, grande parte das desinformações circulam em redes fechadas e as pessoas as recebem diretamente de contatos muito próximos e íntimos, gerando a falsa ideia de que aquele conteúdo possui alguma credibilidade. 

Também, com o avanço das tecnologias comunicacionais digitais, formatos cada vez mais sofisticados têm sido apropriados pelos arquitetos das desinformações. É o caso dos conteúdos conhecidos como “Deep Fakes”, que, por meio do uso de inteligência artificial permitem animações e remixagem de vídeos, áudios e imagens hiper-realistas, tornam ainda mais difícil as percepções sobre veracidade das informações. Veja um exemplo de “Deep Fake” que simulam um discurso do ex-presidente norte-americano, Barack Obama.  

A dinâmica de propagação das desinformações, atreladas a outras práticas reacionárias encabeçadas por esses grupos políticos de extrema-direita, já trazem efeitos devastadores para nossas sociedades. Não é exagero afirmar que essas práticas contribuem para a corrosão do espírito civilizatório-solidário entre os cidadãos, deterioram as democracias e são combustíveis para ascensão de facetas políticas fascistas. 

Assim como os espaços físicos, as redes digitais também são espaços em disputa e devem ser reguladas e ocupadas por todos que buscam neutralizar e combater as desinformações. 

É preciso ter muito cuidado para não se render ao apoio de práticas que dão brechas à censura e, principalmente, criar cada vez mais espaços para debates e de formação que ampliem as capacidades das pessoas em se apropriarem das ferramentas disponíveis, criarem materiais com informações qualificadas e consumirem conteúdos midiáticos com responsabilidade, consciência e criticidade. 

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