Espécies Invasoras! (V.2, N.6, P.2, 2019)
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Divulgador da Ciência: Otávio César Marchetti é bacharel em Ciência e Tecnologia pela Universidade Federal do ABC, finalizando os cursos de Bacharelado e Licenciatura em Ciências Biológicas pela mesma instituição. Tem interesse na área de Ecologia, com foco em Ecologia de Comunidades.
Já pensou um dia você entrar no supermercado e não reconhecer os produtos nas prateleiras? Todos os rótulos estarem em um idioma diferente, irreconhecível? Os produtos todos misturados e você sem conseguir distinguir o que é alimento e o que é perigoso para o consumo? Na natureza existe um fenômeno parecido com isso. Isso acontece quando espécies invasoras dominam o meio ambiente.
Todas as espécies presentes em um determinado local podem ser classificadas como nativas ou exóticas. O Mico-leão-dourado, por exemplo, é uma espécie nativa da nossa Mata Atlântica e sua ocorrência ali é natural. Já a Espada-de-são-jorge que decora o canto da sua sala é uma espécie originária da África.
Mas afinal, quem são as espécies invasoras?
Qualquer espécie exótica só ocorre em um ambiente que não é o seu natural com a intervenção humana. Essa intervenção pode ocorrer de várias maneiras. Pode ser através de uma floricultura que traz uma mudinha de uma flor européia para o Brasil e depois a vende para um cliente. Ou, pode ser de uma maneira acidental, como o caso das abelhas africanas que foram trazidas para o Brasil e depois, em 1956, escaparam do apiário em que eram mantidas e podem ser encontradas na natureza até os dias de hoje.
Muitas das plantas ornamentais que utilizamos para decoração são espécies exóticas e isso não costuma trazer grandes problemas. Agora, toda vez que uma espécie exótica sai de controle e causa prejuízos financeiros ou para o meio ambiente, passamos a chamar essa espécie de espécie invasora.
As espécies invasoras, quando se estabelecem com sucesso em um local, possuem muita vantagem em relação às suas competidoras, principalmente por não possuírem predadores naturais. Elas conseguem se alimentar sem dificuldades no novo ambiente e se reproduzem, gerando novos indivíduos, e, com o passar do tempo, começam a dominar o ambiente quase que não dando mais espaço para as espécies nativas.
O que acontece com os predadores daquelas espécies nativas?
Os impactos ecológicos das espécies invasoras atingem todos os níveis da cadeia alimentar. Atualmente, considera-se que as espécies invasoras são uma das maiores ameaças à biodiversidade do planeta.
Com poucas espécies nativas, o predador nativo daquele local praticamente não encontra mais alimentos disponíveis. É realmente como se ele chegasse a um mercado e todos os produtos estivessem com o rótulo em outro idioma. O predador não sabe se aquele novo indivíduo (a espécie invasora) é alimento ou não, se possui alguma toxina, não sabe nem como capturar aquele indivíduo novo que é diferente do que ele estava acostumado. Um exemplo disso acontece nos recifes de corais da costa brasileira.
Os nossos recifes possuem muitas espécies de animais de diversos tipos, formatos, cores e diferentes texturas. Mas, recentemente, duas espécies têm se proliferado e dominado os ambientes naturais.
O coral sol (Tubastaea tagusensis), originário da Ilha de Galápagos, e o coral sol nativo do oceano Indo-pacífico (Tubastraea coccinea) têm dominado os recifes desde o Ceará até Santa Catarina. Além de esses corais não possuírem um predador natural nesses locais (nossos peixes nativos não os comem), essas duas espécies possuem a capacidade de realizar alelopatia.
Ale-o quê?
A alelopatia é a liberação de compostos químicos nas proximidades do indivíduo que inibem o crescimento de outras espécies. É como se o coral produzisse e liberasse um veneno capaz de matar e impedir que outras espécies cresçam próximas a ele.
Sendo assim, sobra mais espaço para que esse coral possa crescer em tamanho e dominar todo o ambiente. Se não realizado um manejo e controle desses indivíduos, a tendência é que as espécies nativas sejam extintas desses locais, afetando toda a cadeia alimentar. Regiões como Ilha Grande e Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, já apresentam grandes massas desses corais invasores.
As espécies introduzidas também trazem prejuízos financeiros
Em 1859, um colono inglês chamado Thomas Austin levou para a Austrália 24 coelhos originários da Europa. Thomas soltou esses coelhos em sua propriedade com a intenção de praticar caça esportiva. Em 1920, pouco mais de 60 anos depois, a população de coelhos na Austrália era estimada em 10 bilhões de indivíduos. Isso é mais que toda a população de humanos na Terra!
Apesar dos enormes esforços do governo australiano para remover os coelhos, tidos com uma praga nacional, a população atual desse roedor ainda é estimada em 200 milhões de coelhos. Em um país com pouco menos de 25 milhões de habitantes humanos, existem, aproximadamente, 8 coelhos para cada humano na Austrália.
Sem a presença de um predador na Austrália, a população de coelhos cresce de forma indefinida, trazendo muitos prejuízos financeiros para o país, destruindo plantações, removendo boa parte da vegetação nativa, o que leva à exposição direta do solo aos raios solares. Até mesmo os cangurus e os vombates, animais símbolos do país, sofrem com o aumento incontrolável da população de coelhos, pois essas espécies herbívoras competem com eles por alimentos.
Morte aos invasores?
Numa situação assim, a primeira coisa que pode vir à cabeça é remover esses indivíduos do meio ambiente. Parece simples, né? Basta ir lá e capturar ou matar os coelinhos ou raspar os coral sol da pedra. Mas nem sempre isso funciona.
O governo australiano já investiu muito dinheiro para tentar controlar a praga de coelhos. Dentre as ações, as mais famosas são a liberação e incentivo à caça desses animais e a introdução de um vírus mortal para eliminar grandes números de indivíduos.
Ambas as tentativas falharam. A capacidade do humano de caçar os coelhos não é rápida o suficiente em comparação a velocidade de reprodução dos bichinhos. Já a introdução do vírus funcionou, mas apenas momentaneamente. Estima-se que nessas duas tentativas que foram realizadas, cerca de 90% da população de coelhos tenha sido eliminada. Porém, os indivíduos resistentes ao vírus passaram a se reproduzir ainda mais rapidamente, pois, com poucos indivíduos vivos, sobrava alimento e energia para eles se reproduzirem.
No caso dos corais, a situação é ainda mais difícil. Estudos indicam que, ao ser removida da rocha, a colônia de coral sol começa a liberar suas larvas na água. Essas larvas saem nadando a procura de um lugar para se fixar e, quando acham um lugar adequado, se prendem, sofrem uma metamorfose e se transformam em um novo adulto.
E agora, como deter a invasão?
Se você pensou em introduzir no ambiente um predador para as espécies invasoras, vamos lembrar, isso até poderá resolver um dos problemas (como diminuir a população de coelhos) mas, como já foi dito, introduzir mais uma nova espécie pode causar muitos outros problemas! Não é um risco que vale a pena, não é? E aí, o que fazer?
Bem, a primeira estratégia que precisa ser adotada em ambos os casos é investir na pesquisa. Isso mesmo, PESQUISA! Conhecer a biologia de cada espécie invasora é uma ferramenta essencial no combate ao problema.
Entender como o organismo se reproduz, quais podem ser as principais dificuldades para essa espécie sobreviver (temperatura, salinidade da água, espécies que podem ser melhores competidoras etc). Através dessa identificação das características das espécies, podemos traçar planos de manejo adequados para impedir o crescimento desses indivíduos.
Os recentes avanços no campo da genética também podem contribuir. Lembra da estratégia de criar um mosquito geneticamente modificado para combater o Aedes aegypti? Talvez ela também possa ser implementada para controlar as espécies invasoras.
Qualquer que seja a ideia para lidar com espécies invasoras, sem pesquisas, sem estudos… enfim, sem a Ciência, não há solução!
Mas a Ciência não pode (e nem deve) ser exclusiva das universidades. O papel da sociedade é muito importante para desenvolver pesquisa! Você pode ajudar, por exemplo, a monitorar a saúde dos nossos corais! Acesse www.instagram.com/deolhonoscorais/ e saiba como.
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Imagem destacada: Pixabay
Quer saber mais? Algumas referências:
http://www.rabbitfreeaustralia.com.au/rabbits/controlling-rabbits/
http://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/artigos/conheca-o-historico-da-apicultura-no-brasil,c078fa2da4c72410VgnVCM100000b272010aRCRD?origem=segmento&codSegmento=13
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