Bandage para tratamento de câncer e de infecções bacterianas (V.2, N.4, P.6, 2019)
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Amedea Barozzi Seabra é bacharel em Química USP, mestre em Química pela UNICAMP e doutora em Ciências (Química) pela UNICAMP (2006). Realizou pós-doutoramento no Departamento de Química e Bioquímica da Concordia University em Montreal no Canadá (2008-2010). É professora Adjunta IV da Universidade Federal do ABC (UFABC) e foi ganhadora de diversos prêmios nacionais e internacionais. Sua atual área de Pesquisa é “Preparação de biomateriais nanoestruturados liberadores de óxido nítrico para aplicações médicas”.
Você consegue imaginar uma bandage (uma espécie de atadura) com ação antitumoral e antibacteriana? Um material que poderia ser colocado localmente sobre um tumor ou uma região do corpo infectada por bactérias, como ocorre em algumas lesões dermatológicas?
Pesquisadores e alunos da UFABC desenvolveram esse material, que consiste em um filme sólido (tipo uma bandagem) que contém dois princípios ativos que desempenham ações antitumorais e antibacterianas. Esses princípios ativos são o óxido nítrico (NO) e nanopartículas de prata (AgNPs).
Como a bandage é feita?
O material de que estamos falando é constituído de um polímero conhecido como PVA (álcool polivinílico), e aditivado com outro polímero, chamado de PEG (polietileno glicol).
Polímeros, basicamente, são macromoléculas formadas por uma junção de moléculas menores. O PVA é utilizado em diversos produtos conhecidos, como colas, tinta látex, adesivos e gomas de mascar porque tem alta adesividade. Já o PEG (polietileno glicol) é um material gelatinoso utilizado em produtos como cosméticos e remédios e torna a membrana mais flexível.
Nenhum dos polímeros utilizados é tóxico e tanto o NO quanto as AgNPs foram incorporados ao material, que é capaz de liberar simultaneamente quantidades terapêuticas desses princípios ativos (NO e AgNP) conhecidos por sua ação antitumoral e antibacteriana.
Bons resultados nos testes
Nos testes realizados, o material mostrou-se eficiente para eliminar vários tipos de bactérias patogênicas (capazes de produzir doenças infecciosas) e células de determinados tipos de câncer. As características do filme o tornam promissor para tratar tumores malignos ou lesões infecciosas de forma dermatológica.
O material, que pode ser usado como uma bandage ou um adesivo, pode ser colocado localmente em aplicações dermatológicas diretamente em tumores da pele ou de mucosa, ou em feridas infectadas por bactérias. Além disso, esse material também pode ser implantado subcutaneamente, em tumores internos.
Simples, barato e sustentável
As nanopartículas de prata foram preparadas pelo grupo da professora Amedea, utilizando um método simples, barato e muito amigável com o meio ambiente e os seres vivos.
Você imaginaria que chá (sim, aquele que a gente bebe!) pode ser usado (e com sucesso!) para a preparação de nanopartículas de prata? Pois é, o chá é rico em agentes antioxidantes (por isso faz bem à saúde) e esses compostos são capazes de formar nanopartículas de prata, numa simples e imediata reação química (conhecida de oxidação-redução). Dessa maneira, um reagente barato foi capaz de formar nanopartículas de prata com ações antitumorais e antibacterianas.
Por trás da pesquisa
O trabalho foi desenvolvido pelo grupo da professora Amedea e seus alunos de Mestrado Wallace R. Rolim e Joana C. Pieretti, em colaboração com os grupos das professoras Ana Carolina de Souza e Christiane Lombello, ambas da UFABC e com o grupo do Prof. Marcelo Brocchi da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
O estudo, recentemente publicado na prestigiada revista ACS Applied Materials & Interfaces (fator de impacto 8,097), foi desenvolvido ao longo do Mestrado de Wallace R. Rolim, orientado pela professora Amedea. O aluno Wallace desenvolveu seu Mestrado com bolsa da UFABC.
O trabalho também envolveu colaborações científicas, conhecimento e técnicas experimentais das áreas de Biologia e Biomedicina. O artigo científico foi destaque da Sociedade Brasileira de Pesquisa em Materiais (SBPMat) considerado como “artigo do mês – abril” por esta sociedade. O grande apelo desse novo material é sua capacidade de liberar dois princípios ativos que juntos apresentam um sinergismo em aplicações antitumorais e antibacteriais.
A pesquisa com esse material continua no grupo da professora Amedea Seabra. As próximas etapas envolvem o uso do material em modelos de cicatrização cutânea e tumores de pele.
Atualmente, o aluno Wallace Rolim segue seus estudos na UFABC em programa de doutorado. O desenvolvimento dessa tecnologia permitirá um que uma simples bandage possa ser colocada localmente numa região afetada, liberando princípios ativos de maneira controlada e localizada, diminuindo possíveis efeitos colaterais.
Imagem destacada: Max Pixel
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Para saber mais:
O método utiliza-se extrato de chá verde para gerar as nanopartículas a partir de nitrato de prata e foi reportado em um artigo publicado no início deste ano (https://doi.org/10.1016/j.apsusc.2018.08.203).
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Antimicrobial Activity and Cytotoxicity to Tumor Cells of Nitric Oxide Donor and Silver Nanoparticles Containing PVA/PEG Films for Topical Applications. Wallace R. Rolim, Joana C. Pieretti, Débora L. S. Renó, Bruna A. Lima, Mônica H. M. Nascimento, Felipe N. Ambrosio, Christiane B. Lombello, Marcelo Brocchi, Ana Carolina S. de Souza, and Amedea B. Seabra. ACS Appl. Mater. Interfaces, 2019, 11 (6), pp 6589–6604. DOI: 10.1021/acsami.8b19021.
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