|Série Explorando as doenças cardiovasculares por simulações computacionais| #2 – Aplicação de conceitos de mecânica dos fluidos e modelagem computacional à medicina para avaliação de estenose na válvula aórtica. (V. 6, N.9, P.2)

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Neste texto da série, o professor e pesquisador João Lameu da Silva Júnior ( UFABC) supervisionou seus discentes Fernanda Valente Teixeira e Guilherme Augusto C. Rodrigues na elaboração deste texto que trata da aplicação de conceitos de mecânica dos fluidos e modelagem computacional à medicina para avaliação de estenose na válvula aórtica./tds_note]

 

A busca por novos métodos de análises clínicas na área da saúde é constante e com o avanço da tecnologia o leque de possibilidades é expressivamente expandido. A Dinâmica dos Fluidos Computacional (CFD) é uma ferramenta que possibilita a modelagem de condições patológicas para explicação numérica e ilustrada de sintomas apresentados pelos pacientes que apresentam alguma condição patológica.

Estenose Aórtica

A estenose aórtica é uma doença que prejudica a passagem de sangue pela válvula aórtica do coração. Essa condição é decorrente da calcificação dos folhetos da válvula que compromete sua abertura completa fazendo com que o coração precise de maior esforço para exercer suas funções.

Com a progressão da doença o paciente começa a apresentar sintomas que indicam sobrecarga cardíaca, tais como: tontura, síncope, dores no peito, falta de ar, arritmias, cansaço, dentre outros. A longo prazo, pode levar ao remodelamento da aorta torácica (Figura 1), causando dilatação e em casos severos até mesmo o rompimento desta artéria, levando à quadros graves de hemorragia.

 

Figura 1. Ilustração da estenose aórtica e anatomia do coração e aorta (Fonte: Adaptado de https://www.drdiegogaia.com.br/tratamento-transcateter e https://my.clevelandclinic.org/health/diseases/16876-aortic-coarctation)

 

Tratamento

Uma das opções de tratamento para pacientes de alto risco e/ou com condições inoperáveis pelos meios convencionais, é o Tratamento Transcateter da Válvula Aórtica (Figura 2). Esse tratamento consiste no implante de uma nova válvula sintética via cateter para restabelecer a área de abertura da válvula em conformidade com os parâmetros considerados saudáveis.

 

Figura 2. Implante Percutâneo de Válvula Aórtica – TAVI (Transcatheter Aortic Valve Implantation) (Fonte: https://clinicasaadi.com.br/tavi/)

 

Simulação Computacional por CFD

Utilizando ferramentas de modelagem e simulação computacional, foram feitas comparações hemodinâmicas que avaliam os movimentos e pressões da circulação sanguínea de forma comparativa em um paciente com Estenose Aórtica Grave e um paciente com condições saudáveis após tratamento com TAVI considerando a geometria de uma aorta torácica, obtida de um repositório livre.

Para avaliação dos resultados, foram comparadas as diferenças de tensão de cisalhamento (medida da força de atrito entre o sangue e a parede vascular), linhas de velocidade da velocidade (permite visualizar os padrões do fluxo sanguíneo) e vazão de sangue nas ramificações que nascem da aorta.

 

Tensão de Cisalhamento e Linhas de Velocidade

Avaliando os resultados abaixo, é possível observar aumento de tensão de cisalhamento na parede (Figura 3) e também aumento de velocidade do sangue (Figura 4) nas regiões próximas à região da válvula aórtica para o caso de estenose grave.

 

Figura 3. Campo de tensão de cisalhamento na parede (Wall Shear) da aorta para os casos com estenose grave e após implementação da válvula aórtica no instante de pico de ejeção do sangue a partir do coração e valor médio após um ciclo cardíaco completo. Os resultados são apenas ilustrativos e foram obtidos pelo software Ansys Student (Fonte: próprios autores).

 

Figura 4. Linhas de corrente do fluxo de sangue (velocidade) na aorta para os casos com estenose grave e após implementação da válvula aórtica no instante de pico de ejeção do sangue a partir do coração e valor médio após um ciclo cardíaco completo. Os resultados são apenas ilustrativos e foram obtidos pelo software Ansys Student (Fonte: próprios autores).

 

Com isso, há aumento de fluxo sanguíneo para as saídas mais próximas a válvula e diminuição de fluxo nas saídas mais distantes, sendo nesse caso, a artéria descendente abdominal, responsável pela distribuição de sangue aos membros inferiores. Para uma aorta saudável, é reportado que pelo menos 60% do volume de sangue deve ir para os membros inferiores (QIAO et al., 2020; PIROLA et al., 2017). Este fato foi comprovado numericamente pela diferença das vazões (volume de sangue) mostradas no gráfico abaixo:

 

 

Desta forma é visto que a simulação hemodinâmica pela técnica CFD permite observar de forma detalhada os padrões do fluxo sanguíneo na aorta do paciente antes e após o Tratamento Transcateter da Válvula Aórtica, fornecendo também indicadores de relevância clínica que poderiam ser usados pelos profissionais da medicina para direcionar os próximos passos no cuidado da saúde do paciente.

 

Referências 

ALIMOHAMMADI, M. et al., Development of a patient-specific simulation tool to analyse aortic dissections: Assessment of mixed patient-specific flow and pressure boundary conditions. Medical Engineering & Physics, 36, 275–284, 2014.

AORTIC COARCTATION. Disponível em: https://my.clevelandclinic.org/health/diseases/16876-aortic-coarctation). Acesso em: 03/05/2023.

GAIA, Diego. O que é a Estenose Aórtica Grave. Disponível em: https://www.drdiegogaia.com.br/tratamento-transcateter. Acesso em: 26/02/2023.

PIROLA, S. et al., On the choice of outlet boundary conditions for patient-specific analysis of aortic flow using computational fluid dynamics. Journal of Biomechanics, 60, 15–21, 2017.

QIAO, Y. et al., Biomechanical implications of the fenestration structure after thoracic endovascular aortic repair. Journal of Biomechanics, 99, 109478, 2020.

TAVI, Implante Percutâneo de Válvula Aórtica. Disponível em: https://clinicasaadi.com.br/tavi/. Acesso em: 03/05/2023.

TONINATO, R. et al. Physiological vortices in the sinuses of Valsalva: An in vitro approach for bio-prosthetic valves, Journal of Biomechanics, 49, 2635–2643, 2016.

VMR, Vascular Modelo Repository. Disponível em: https://www.vascularmodel.com/dataset.html. Acesso em: 20/03/2022.

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