Maçãs embaladas podem ser consumidas sem lavar – Fato ou mito? (V.6. N.7. P.3, 2023)

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Divulgadores e divulgadoras: Arthur Norio Morita Osakawa, Jéssica Vieira Santos, Linda Paula Cordeiro, Lucas Souza Benites, Luiz Henrique Monis Samello, Luiz Henrique Ribeiro Daniel, Richard Kenji de Lima Narumi, William Fernandes Dias, Renata Simões

O consumo regular de frutas é recomendado para auxiliar na prevenção de doenças, como diabetes, obesidade e hipertensão arterial, uma vez que elas possuem ação antioxidante e são ricas em vitaminas, minerais e nutrientes. Dentre as frutas mais consumidas pelos brasileiros, o Ministério da Saúde aponta um aumento no consumo de maçãs, bananas, laranjas e melancia.

Dentre as frutas mais consumidas no Brasil, a maçã é a única que pode ser consumida com casca. O consumo de frutas sem a retirada da casca aumenta a chance de problemas gastrointestinais, quando esta não é higienizada corretamente. O Ministério da Saúde alerta que a ingestão de alimentos não higienizados contribui significativamente para a ocorrência de Doenças transmitidas por Alimentos (DTA), como infecções ou intoxicações na forma aguda ou crônica. Um estudo conduzido pelo Centro de Pesquisas em Alimentos (Food Research Center – FoRC) da USP mostrou que quase metade dos brasileiros higienizam as frutas de forma inadequada ou, eventualmente, não realizam nenhum tipo de higienização antes de ingerir o alimento.  

No comércio de hortifruti é comum encontrar produtos embalados e higienizados. Esses alimentos podem ser consumidos sem a necessidade de higienização prévia. Uma vez que a venda de alimentos embalados e previamente higienizados estimula o consumo imediato, sem que o cliente repita o processo de higienização antes do consumo, é importante avaliar se as embalagens são eficientes em manter os alimentos livres de micro-organismos que possam causar prejuízos à saúde humana. 

Visto que alimentos contaminados por micro-organismos podem causar problemas para a nossa saúde, nós fizemos um estudo para avaliar se as embalagens de maçãs conseguem manter a fruta livre de micro-organismos, permitindo que possamos consumir sem lavar. No mesmo estudo, verificamos se existem micro-organismos em maçãs vendidas em embalagens lacradas ou sem embalagem e por fim, comparamos qual o método de higienização é mais eficiente para limpar maçãs vendidas em embalagens lacradas ou sem embalagem. 

Para este estudo utilizamos maçãs compradas com embalagem e sem embalagem. As frutas foram divididas em 10 grupos (Quadro 1). Uma amostra de maçã sem embalagem (T1) e uma amostra de maçã embalada (T2) não foram higienizadas para verificar o desenvolvimento de micro-organismos sem nenhuma interferência de métodos de higienização. Todos os métodos de higienização foram realizados por 30 minutos, mantendo as maçãs submersas nas soluções de limpeza, exceto os grupos que não foram lavados (T1 e T2).

 

Quadro 1 – Descrição dos métodos de limpeza das maçãs com ou sem embalagem.

Tipo de higienização Como foi feita a higienização?
Maçã sem embalagem lavada com água de torneira (T3) As maçãs foram lavadas com água corrente
Maçã embalada e lavada com água de torneira (T4)
Maçã sem embalagem lavada com água e detergente (T5) As maçãs foram lavadas solução de água e detergente 
Maçã embalada lavada com água e detergente (T6)
Maçã não embalada e lavada com água e vinagre (T7) As maçãs foram lavadas em solução preparada com 2 partes de vinagre para 5 de água
Maçã embalada e lavada com água e vinagre (T8)
Maçã não embalada e lavada com água e água sanitária (T9) As maçãs foram lavadas em solução preparada com 1 parte de cloro para 4 de água
Maçã embalada e lavada pacote com água e água sanitária (T10)

 

Depois de preparar as maçãs, todas as amostras foram colocadas em placas de Petri, de acordo com o tratamento (T1 a T10) contendo 15 mL de meio de cultivo (LB Broth) conforme mostra a figura 1. Todas as placas foram mantidas em estufa bacteriológica a 37oC por 72 horas. Todo o experimento de microbiologia foi realizado em fluxo laminar.

Figura-1: Placas de petri confeccionadas para a análise microbiológica de maçãs embaladas e não embaladas. C1=controle negativo; C2= controle positivo; T1=Amostra de maçã não embalada e sem nenhum método de higienização; T2= Amostra de maçã embalada e sem nenhum método de higienização; T3= Amostra de maçã sem embalagem lavada com água; T4= Amostra de maçã embalada e lavada com água; T5= Amostra de maçã sem embalagem lavada com água e detergente;T6= Amostra de maçã embalada e lavada com água e detergente; T7= Amostra de maçã não embalada e lavada com água e vinagre; T8= Amostra de maçã embalada e lavada com água e vinagre; T9= Amostra de maçã não embalada e lavada com água e água sanitária; T10= Amostra de maçã embalada e lavada com água e água sanitária.

Depois do tempo de incubação na estufa observamos que as maçãs que não foram lavadas (T1 e T2) apresentaram desenvolvimento de micro-organismos. O mesmo aconteceu com as maçãs lavadas apenas com água (T3 e T4), mas em menor quantidade, quando comparado com as maçãs não lavadas (Figura 2). Nas frutas lavadas apenas com água observamos ainda que aquelas que foram compradas em embalagem lacrada apresentaram maior crescimento de micro-organismos (T4), quando comparadas com as frutas adquiridas sem embalagem (T3) (Figura 2).

Figura 2 – Imagem das placas de petri contendo amostras de maçãs sem embalagem e lavada com água (T3) e maçãs embaladas e lavadas com água (T4). A, B, C indicam os dias 1, 2 e 3 de observação, respectivamente.

Quando avaliamos as maçãs lavadas com água e sabão (T5 e T6) percebemos que os resultados foram parecidos com o que ocorreu com as frutas lavadas apenas com água (T3 e T4). As maçãs compradas com embalagem (T6) também apresentaram proliferação de micro-organismos, o que não foi visto nas maçãs sem embalagem (T5) (Figura 3).

Figura 3 – Imagem das placas de petri contendo amostras de maçãs sem embalagem e lavada com solução de água e sabão (T5) e maçãs embaladas e lavadas com solução água e sabão (T6). A, B, C indicam os dias 1, 2 e 3 de observação, respectivamente.

Possivelmente por não se tratar de uma embalagem a vácuo, as maçãs não foram mantidas em ambiente estéril, ou seja, as frutas, mesmo dentro da embalagem mantém contato com o meio ambiente e com diversos tipos de micro-organismos. Além disso, é possível que a embalagem tenha criado um ambiente propício para o crescimento bacteriano, de modo similar as estufas bacteriológicas. Por fim, não foi possível encontrar informações sobre o método de lavagem das maçãs empregado pela indústria. 

A solução de vinagre não foi eficiente para higienizar as maçã (T7 e T8) (Figura 4). Foi observado que o crescimento de micro-organismos foi maior, quando comparado com os métodos de higienização utilizando apenas água (T 3 e T4) ou solução de água e detergente (T5 e T6).

Figura 4 – Imagem das placas de petri contendo amostras de maçãs sem embalagem e lavada com solução de vinagre (T7) e maçãs embaladas e lavadas com solução de vinagre (T8). A, B, C indicam os dias 1, 2 e 3 de observação, respectivamente.

Já a lavagem utilizando solução de água sanitária foi eficiente para higienizar as maçãs (T9 e T10). Nas maçãs não embaladas (T9) foi observado o crescimento de apenas uma colônia de micro-organismos (Figura 5). No entanto, nas maçãs embaladas (T 10) não houve crescimento de micro-organismos (Figura 5).

Figura 5 – Imagem das placas de petri contendo amostras de maçãs sem embalagem e lavada com solução de hipoclorito de sódio (T9) e maçãs embaladas e lavadas com solução de hipoclorito de sódio (T10). A, B, C indicam os dias 1, 2 e 3 de observação, respectivamente.

Com esse estudo foi possível mostrar que a embalagem lacrada não é suficiente para a proteção total contra micro-organismos. Assim, o consumo direto da fruta sem nenhum método de higienização não é recomendado. Por fim, a maneira mais eficaz de higienizar maçãs, independentemente da embalagem, é utilizar solução de hipoclorito de sódio por 30 minutos. 

 

REFERÊNCIAS

  1. CASTANHO GKF; MARSOLA FC; McLELLAN KCP; NICOLA M; MORETO F; BURINI RC. Consumo de frutas, verduras e legumes associado à Síndrome Metabólica e seus componentes em amostra populacional adulta. Ciência e Saúde Coletiva, v. 18, n. 2, p. 385-392, 2013. Disponível em: https://www.scielosp.org/j/csc/i/2013.v18n2/?section=ARTIGO Acesso em: 29 de março de 2023.
  2. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis. Vigitel Brasil 2019: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico: estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal em 2019 [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças não Transmissíveis. – Brasília: Ministério da Saúde, 2020. 137. : il. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/vigitel_brasil_2019_vigilancia_fatores_risco.pdf Acesso em: 29 de março de 2023.
  3.  TRABBOLD, A. Brasileiros higienizam alimentos de forma inadequada na pandemia. Jornal USP, 25 set. 2020. Disponível em: https://jornal.usp.br/ciencias/brasileiros-higienizam-alimentos-de-forma-inadequada-na-pandemia/ Acesso em: 29 de março de 2023.

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