Abelhas morrem de fome no outono e aves no inverno nas ruas de Santo André (V.3, N.5, P.1, 2020)
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Quando você vai à feira, nota que algumas frutas não estão disponíveis o ano todo, certo? E, caso esteja procurando por alguma fruta mais difícil de encontrar, pode ser que precise ir até alguma feira maior, como o Mercado Municipal de São Paulo, a uns 40 minutos de carro do centro de Santo André. Bem longe para buscar uma fruta, não é?
Agora, imagine que você é uma abelha ou um beija-flor que depende de flores de algumas espécies de plantas para obter néctar, seu único alimento. Imagine, também, que essas plantas existem em poucas quantidades em alguns locais. Neste caso, você, a abelha ou o beija-flor, passará fome e poderá morrer por falta de alimento disponível.
Quem é santoandreense deve se orgulhar da grande quantidade de espécies de árvores que estão nas ruas da cidade, elas somam mais de 200 espécies! Uma curiosidade: você sabia que as árvores mais comuns nas ruas de Santo André não são nativas do estado de São Paulo? Pois é! As árvores mais encontradas em Santo André são o cajueiro-japonês (Hovenia dulcis), nativo da China, Coreia e Japão, o ligustro (Ligustrum lucidum), nativo da China e a sibipiruna (Poincianella pluviosa var. peltophoroides), que ocorre em matas primárias no Rio de Janeiro, Sul da Bahia e Pantanal Mato-grossense.
Árvores com flores e frutos como essas espécies encontradas nas ruas deste município da região do ABC, no estado de São Paulo, são visitadas por insetos, aves e morcegos que buscam alimento. Suas flores possuem néctar, que é o alimento de abelhas, vespas, besouros e morcegos. Já seus frutos, que assim como as flores, são encontrados apenas em determinados períodos do ano, são adorados por aves e morcegos. Assim, as árvores das ruas de Santo André podem servir de alimento principalmente para abelhas e vespas em busca do néctar das flores, enquanto os frutos mais disponíveis são alimentos para aves. Porém, como as flores e os frutos não são igualmente distribuídos pela fauna, algumas espécies têm menos flores e menos frutos disponíveis pela cidade, como, por exemplo, é o caso dos morcegos.
A região centro-oeste do município de Santo André, por exemplo, nos bairros Vila Guiomar ou Vila Valparaiso, apresenta mais espécies de árvores com flores e frutos que podem servir de alimento para a fauna. No entanto, no inverno, os frutos estão menos disponíveis e no outono as flores estão menos disponíveis. (Lembra que as flores são alimentos de umas espécies e os frutos de outras?) Pois é (!), isso significa que, provavelmente, as abelhas passam fome no outono, enquanto as aves passam fome no inverno.
Para que as ruas de Santo André tenham alimento suficiente disponível para as aves, insetos e morcegos, mais árvores que produzem esse alimento devem ser plantadas, principalmente nas regiões que tem maior escassez desse recurso, no nosso caso, nas regiões sul e norte, priorizando o plantio de espécies nativas do estado de São Paulo.
Em cidades, corredores ecológicos unem áreas verdes separadas por áreas mais intensamente usadas por atividades humanas, como por exemplo, prédios e avenidas. Ruas arborizadas e com alimento disponível para a fauna podem servir como corredores que fornecem acesso para aves, insetos e morcegos às áreas verdes, maiores e com mais recursos para sobrevivência da fauna.
Uma cidade com mais áreas verdes e mais corredores para a fauna possui maior oferta de serviços ecossistêmicos, como controle de pragas (ex. mosquitos vetores de doenças como a dengue), ar puro e qualidade de vida para sua população. Então, com a manutenção de ruas arborizadas na cidade, todo mundo tem a ganhar!
Referência: Freitas, S. R., Tambosi, L. R., Ghilardi-Lopes, N. P. & Werneck, M. S. 2020. Spatial and temporal variation of potential resource availability provided by street trees in southeastern Brazil. Urban Ecosystems. DOI: https://doi.org/10.1007/s11252-020-00974-8
Artigo de divulgação sobre “Freitas et al 2020 Spatial and temporal variation of potential resource availability provided by street trees in southeastern Brazil”
Figura: Bombus_transversalis.jpg
Glossário: polinização = reprodução de plantas com sementes quando o pólen passa de um estame (aparelho reprodutor masculino) para o estigma (aparelho reprodutor feminino) da flor, feita naturalmente por agentes externos (vento, água, insetos etc.) ou, artificialmente, por interferência humana.
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